É fato comum a burguesia procurar territórios onde possa continuar a desfrutar dos privilégios. É fato comum a burguesia ter como moral, como diz o teatrólogo alemão Brecht, “primeiro a barriga”. O que ela pretende mesmo é se dar bem, não importa com quem. Mas a burguesia é também ardilosa. Não pretende ser entendida como uma mera aproveitadora. Simples ente parasitário que se alimenta dos bens dos outros. A burguesia quer ser também tomada como sensível e inteligente. Principalmente quando os fatos estão quase definidos e lhes possibilitam um bom aproveitamento.
É o que está ocorrendo com a burguesia de São Paulo e do Rio de Janeiro depois que entendeu que a vitória de Dilma é irreversível. E que Serra está perdido em sua própria insuficiência política, juntamente com seus aliados. Por isso, a burguesia sabe que a grande jogada interesseira é se aliar à candidata Dilma Rousseff, porque, em seus planos, além de se dar bem, ainda se mostra como uma classe que evoluiu, saiu de seu obscuro estado direitista para ingressar em uma ordem que se diz esquerdista.
Primeiramente foi a socialite Geyze Diniz, esposa do empresário Abílio de Diniz, presidente do Grupo Pão de Açúcar. O mesmo Abílio Diniz que foi sequestrado nas vésperas da eleição em que Lula disputou com Collor a Presidência da República, e os sequestradores foram apresentados pela polícia do então governador Fleury vestidos com camisas do Partido dos Trabalhadores. Uma sórdida trama para levar o povo brasileiro a acreditar que se Lula fosse eleito o Brasil iria entrar no caos comandado pela violência. O que levou, posteriormente, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) afirmar que se Lula ganhasse ele deixaria o Brasil. O mesmo sentimento paranoico que levou também, posteriormente, a atriz global Regina Duarte proferir o seu grotesco sentimento infantilizado: “Estou com medo”.
O convite de Geyze Diniz a Dilma para participar de um encontro com outras socialites da elite de São Paulo, em sua mansão, para, entre algumas amenidades, falar sobre seu programa de governo, que deixou todas participantes maravilhadas com a inteligência, o talento e a cordialidade de Dilma, veio só confirmar a relação que Abílio Diniz tem nesse momento com o presidente Lula. Uma espécie de demonstração de que o preconceito contra o PT ou terminou ou arrefeceu. Uma confirmação de que uma parte da burguesia de São Paulo já se encostou no governo, e por isso quer a vitória de Dilma.
Já na sexta-feira, dia 12, será a vez da viúva de Roberto Marinho, fundador e ex-presidente da Fundação Roberto Marinho – Rede Globo -, Lili Marinho, oferecer uma homenagem à candidata Dilma Rousseff. Lili Marinho, a viúva de Roberto Marinho, que comandou em sua emissora uma das maiores trapaças jornalísticas já ocorridas em debate transmitido por um canal de televisão. No dia posterior ao debate de Lula com Collor, a sua emissora montou uma edição mostrando os momentos em que Lula aparecia abatido pela sórdida declaração que Collor fizera sobre o envolvimento de Lula com uma namorada, que, segundo Collor, mandara abortar. Como a edição era uma montagem para favorecer Collor, o candidato da Globo foi apresentado só nos momentos em que parecia como se tivesse derrotado Lula. O mesmo Roberto Marinho que permitiu que fosse escamoteada a notícia da queda do avião da Gol, onde morreram todos passageiros, para exibir o falso dossiê contra Serra.
Outras homenagens oferecidas pela burguesia brasileira para Dilma ocorrerão. Fazem parte de sua moral gastronômica. Mas deixando de lado essa façanha indiscreta da burguesia – se é que se pode deixar de lado tão contagiante fato -, o que salta mesmo é a certeza que esses eventos trazem como confirmação de que Serra já perdeu essa eleição, fato até já dito pelo seu cabo eleitoral maior, Fernando Henrique, acompanhado pelo presidente de seu partido, PSDB, Sérgio Guerra. É uma situação de causar frouxos risos. Não se precisa nem do talentoso do lusitano Manuel Maria Barbosa Du Bocage. Serra é a própria piada.
Leitores Intempestivos