Contabilizar é um ato neurótico porque as pessoas ficam calculando suas perdas e danos. “Onde foi que acertei. Onde foi que errei”. Tudo o que se encontra no passado. É neurótico, porque as perdas e ganhos não mudam em nada o presente. O máximo que fazem é estabelecer uma falsa-alegria pela confirmação do ganho, e uma falsa-tristeza pela confirmação da perda. Para os neuróticos, uma forma de se precaver no futuro. Como se pudéssemos atualizar, a priori, o futuro que é virtual.
O filósofo Spinoza diria que o ato de contabilizar é uma ideia-triste, porque expressa um medo passado e futuro, como a esperança. Mas o pior, é que se esse medo for tirado o indivíduo desespera. E desesperado não sabe mais o que fazer com o tempo que é o suporte da contabilização das perdas e ganhos. Agora, quando ao invés de se contabilizar fatos-temporais tendo o medo como elemento impulsionador, e se recorre à névoa-virtual das imagens-lembranças, como fala o filósofo Bergson, imagens que não atuam mais, em razão de formarem o corpo-passado, mas como fator base do humor, então o trânsito é livre para se comentar um passado. Principalmente quando esse passado foi um presente congelado.
Pois é só como presente congelado que se pode comentar o ano de 2013 da gestão do prefeito de Manaus, Arthur Neto, do partido da burguesia-ignara paulistana, PSDB. Se há um grande feito a ser considerado no 1° ano de gestão de Arthur Neto, é a capacidade que ele teve de manter congelado o tempo-histórico de Manaus. Arthur manteve Manaus no mesmo estado de congelamento-histórico que seus antecessores submeteram a não-cidade de Manaus. Em verdade, ele só usou os mesmo recursos técnicos-burocráticos que já haviam sido usados em sua primeira gestão, no fim da década de oitenta. Recursos também conservadores do congelamento imposto pelas anteriores administrações.
O bom em tudo isso, é que se alguém quiser neuroticamente fazer a contabilidade da gestão de Arthur, vai se frustrar: não há o que contabilizar. Não há fatos. Não há temas. Alguém pode dizer: ”Mas ele mandou passar asfalto na Avenida Djalma Batista, a principal Avenida de Manaus. Isso tem que ser contabilizado”. Não. Isso é reflexo do gelo de outras administrações. Outros já haviam gelado as vias urbanas de Manaus. Arthur só operou para conservar o estado congelado da Djalma Batista e aproveitar para fazer marketing junto às consciências-congeladas de moradores que afirmam que recapeamento da Djalma Batista é tema de contabilização. Para entender é só seguir o significado de recapear. Encapar de novo. Se a Djalma Batista estava congelada como via urbana, Arthur só colocou outra capa-gelada.
Ao contrário do governo Dilma, o prefeito de Manaus não tem o que comemorar administrativamente em seu primeiro ano de gestão. O sistema de transporte coletivo continua da mesma forma: inexistente. As ruas continuam as mesmas: cheias de buracos. A higiene urbana continua a mesma: ruas com esgotos transbordando e lixos proliferando. O lazer municipal continua o mesmo: inexistente, ou se resumindo a um balanço na velha e privatizada Praia da Ponta Negra. A relação da prefeitura com a imprensa continua a mesma: aliança de cumplicidade.
Se algum órgão da imprensa de Manaus fosse um tiquinho independente poderia fazer a seguinte pergunta para os moradores, para saber se a administração de Arthur pode ser objeto de avaliação-contábil. “Arthur e Amazonino são prefeitos iguais?” Não ia dá outra. A resposta seria: “Arthur é igual à Amazonino.”
Afirmar que Arthur e Amazonino são iguais como prefeito de Manaus comprova como essa não-cidade encontra-se congelada. Esses moradores não diferenciam a gestão de Arthur da de Amazonino, nem da de Amazonino da de Arthur, dada à igualdade das duas. Não é oferecido a eles o mais elementar signo para que se produza conhecimento. Para se conhecer um objeto é necessário que o sujeito do conhecimento possa, na objetividade, encontrar categorias que se sirvam de referencial ao objeto a ser conhecido. Diferenças entre os objetos opostos. Como não existem diferenças entre a gestão de Arthur e Amazonino, como existem entre a gestão de Lula/Dilma com a de Fernando Henrique, os moradores de Manaus não estabelecem conhecimentos diferenciais. Tudo é Arthur/Amazonino, Amazonino/Arthur.
Daí segue-se que só pelo humor – nietzschiano – pode-se comentar o 1° ano de gestão de Arthur. Ou melhor: a gestão que não existiu como identidade própria. Um fato que deprime os contabilistas-neuróticos que não podem enumerar perdas e danos.
O que é mais humorístico nessa realidade congelada é que Manaus tem um clima quente e úmido. Conservando Manaus congelada, Arthur, não perdeu de todo o ano de 2013. Mostrou que o homem pode realmente mudar a natureza.
Leitores Intempestivos