O filósofo francês Gilles Deleuze, certa vez, ao ser submetido a um exame médico em que o aparelho não revelava o que o médico pretendia, viu o quanto ele ficava irritado. Nisso, compreendeu o espírito de determinados médicos: reagem ao que o materialismo capitalista lhes proporciona e querem que seus instrumentos sempre lhes sejam fiéis. Sem isso, desesperam. E elaborou um raciocínio que conduz a inferência de que esses médicos são famosos, vaidosos, orgulhosos, ambiciosos, calculistas, arrogantes, ganham muito dinheiro, mas não sabem gastá-lo. O que Deleuze quis dizer é que presos ao materialismo capitalista esses médicos se expressam no mundo como objeto. E como a sociedade capitalista é a síntese desses objetos, esses médicos reificam suas existências pela prova do materialismo capitalista.
Dessa forma, como prova do materialismo capitalista esses médicos ocultaram, em si, a alteridade, a singularidade simpática e empática que compromete toda existência particular de indivíduo com a existência do outro. A expressão ontológica do existir em comunidade. O comum a todos, como diz o filósofo Spinoza. A composição universal da democracia. A sociedade dos amigos, como nos legaram os gregos. Esses médicos eliminaram em si a alteridade, e sem a singularidade da alteridade que se realiza na relação com o outro, o diferente de si, eles acreditam que são atuantes em razão de suas semelhanças com profissionais que, também, carregam a prova do materialismo capitalista. Em aforismo politico: a denegação do que é público.
OS MÉDICOS-BURGUESES E SEU PATHOS DO RESSENTIMENTO
Esse espírito da prova do materialismo capitalista, e que na prática é a denegação da comunalidade como representação pública, é o pathos do ressentimento dos médicos-burgueses como expressão da vida reativa: “eu sofro e a culpa é tua”. Esse o fator básico do discurso do estrato da classe privilegiada, que odeia os governos populares de Lula e Dilma, passando por Maduro/Chávez, Cristina Kirchner, Bachelet, Mujica, Morales, Rafael, todos que se manifestam como democracias livres da opressão dos impérios.
São esses médicos-burgueses, compassivos e ineficazes, como afirma o filósofo francês Clemènt Rosset, que se dizem contrários ao Programa Mais Médicos. Embora não sejam nada contrários, visto que para ser contrário é fundamental a crítica, no sentido marxista, e não obstinação-compulsiva de se querer contra. Mas, “apropria-se da matéria em pormenor a ser criticada, analisar sua forma de desenvolvimento, e encontrar todos os seus elos internos”, como afirma a dialética do filósofo Marx. O que só pode ser realizado pelo sujeito/histórico que estiver no princípio da alteridade. O que não é caso dos médicos-burgueses aprisionados no pathos do ressentimento. O que nega a vida.
ONDE MALBA TAHAN É ESCULACHADO
Assim, sendo figura e fundo ao mesmo tempo, onde tudo é confundido, como afirmam os gestaltistas, os médicos-burgueses de Manaus, partiram para campanha eleitoral antecipada contra a candidata a reeleição, presidenta Dilma Vana Rousseff. Fazendo uso de uma das formas de solidão-virtual das teletecnologias, whatspp, eles estão enviando mensagens “altamente politizadas” aos seus congêneres, onde o matemático Malba Tahan – pseudônimo de Júlio César de Mello e Souza -, é esculachado depois de sua solidária prática do ensino da matemática.
“O Brasil terá 400 mil médicos em 2014. Se cada um tirar 25 votos da Dilma, serão 10 milhões de votos. E o Brasil estará livre da peste petista”.
Um texto sofrível, digno de médico-burguês. Que não traz abordagem geral, diagnóstico, intervenção e avalição, do quadro democrático real. E ainda completa: “Envie essa mensagem para um médico, seu amigo”.
Malba Tahan sorrir de tal genialidade que pretende a probabilidade como fato. A genialidade matemágica não sabe que até o ressentimento tem graus. Os médicos-burgueses são ressentidos em seus graus particulares, que embora corporativos, têm seus interesses que vão além da ficção apresentada pela corporação. E um número não sintetiza esses interesses unidos à prova do materialismo capitalista. A genialidade não sabe que existem médicos não ressentidos, no meio dos 400 mil, que entendem que cada profissional, em uma sociedade, realiza uma “função representativa que satisfaz uma necessidade social (Marx)”. O sapateiro é representante de todos os indivíduos, assim como o médico – que escapou da prova do materialismo capitalista – é, também, representante de todos os indivíduos. O que afirma a sua não alienação. Essa a alegria de Malba Tahan: jamais existirão 10 milhões de votos de médicos contra Dilma.
O que salta como pateticamente perigoso é o fato do gênio da matemágica-médica, querer atribuir sua genialidade a todos os médicos. Que os magicamente calculados 400 mil sejam como ele: um triste alienado em si mesmo. Uma ofensa à classe. Um caso clínico-político que deveria ser analisado-terapeuticamente pelo Conselho Nacional de Medicina (CNM), já que um dos requisitos elementares para praticar a medicina é, pelo menos, uma inteligência mediana socializada. Caso contrário, como ocorre com o gênio da matemágica, nega a Deontologia Médica.
A FORÇA DO ESCRAVO-TIRANO
Outro enunciado que escancara a alienação do gênio da matemágica-médica, é o uso da palavra amigo: ”Envie essa mensagem para um médico, seu amigo”. Como sujeito-sujeitado, como mostra o filósofo Guattari, na prova do materialismo capitalista, ninguém é livre. E não se sendo livre se é escravo ou tirano. E como diz o filósofo Nietzsche, escravo não é amigo, e tirano não tem amigo. Logo, a mensagem-vazia não se materializa. Operação simples, não?
Diante desse desespero, esses médicos-burgueses, já que são tão ressentidos, deveriam é começar a imaginar como irão perambular durante os próximos 4 anos, sem esculachar Malba Tahan, porque 2015 já chegou. Dilma já somou mais 4 pontos anuais de um programa ‘petistamente pestilento’. Sem qualquer matemágica. Diria zombeteira, a subjetividade ‘peste petista’.
Leitores Intempestivos