Pintura O Sopro do Inferno, de Bosch.
Produção Afinsophia.
A estrutura de uma sociedade são suas instituições com suas corporações e burocracia. Segundo o filósofo Hegel as corporações são a matéria da burocracia e a burocracia o espírito das corporações. Ou seja, há um entrelaço contínuo entre esses dois corpos estatais que se desdobram nos estamentos institucionais.
As instituições na sociedade capitalista são aparelhos ideológicos, como nos dizem os filósofos Marx e Engels. São elas que modelam os indivíduos tornando propagadores e defensores de seus estamentos. As instituições, como estamentos, são verdadeiras produtoras de subjetividades que apresentam regras e normas de obediência, em troca de segurança aos que são seus agentes propagadores em todos os territórios em que transitem e se fixem. “Numa instituição formula-se um discurso”, afirma a psicanalista Maud Mannoni.
Mas as instituições não se mostram apenas em seus corpos materiais, elas também funcionam com seus corpos imateriais. Elas não atuam apenas como corpo sedutor que faz com que os indivíduos lhes procurem por necessidade material, como ser um agente de seu discurso proporcionado pelo ingresso em seu corpo através de concurso. Elas também servem de corpo defensivo dos elementos persecutórios de indivíduos que não sabem, e nem podem, dominar as suas investidas no ego. O que causaria angústia e desespero. E, consequentemente, obnubilação-psíquica.
O que significa que as instituições com suas regras, suas normas, suas relações hierárquicas, suas concepções, determinações, convenções e interdições servem de mecanismos de defesa. “Os indivíduos podem, assim, jogar na vida da instituição seus objetos persecutórios internos”, afirma o psicanalista Lacan. Ou, como diz o psiquiatra J. Oury, da Clínica La Borde, amigo do filósofo-psiquiatra Fèlix Guattari, “a instituição é um sistema de defesa”.
Como para esses indivíduos, que adentram nas instituições para se defenderem de seus impulsos psicóticos, elas não surgem para seus egos como realidade objetivamente social, mas como mecanismos de defesa. O que significa que eles não atuam movidos pelo discurso concreto das instituições, mas através do entrelaço de seus impulsos e a realidade das instituições. Funciona em estado de escotomatização: “naõ vejo que não quero ver”. Eles se situam em um estado fronteiro. Daí a impossibilidade de conceberem a objetividade como real. Assim, o grande perigo para a sociedade é que sendo eles agentes institucionalizados, portanto, com autoridade concedida pelo Estado, suas decisões são tomadas por eles e por parte da sociedade incauta (na verdade alienada da mecânica social, diz Guattari) como verdades.
Partes dos estamentos institucionais do país, já alguns anos, vêm expressando esse sintoma. Porém, há um grande desentendimento por parte da sociedade sobre o que significa esse sintoma como ameaça à democracia. Daí que esse sintoma é tratado pela lógica estabelecia apenas como normalidade de seus quadros óbvios institucionais. O que acarreta a ocultação da verdade paranoica desse sintoma ameaçador à democracia. Com esse tratamento, por essa parte da sociedade, o discurso social-psicopatológico não é alterado. E, dessa forma, se mantém a enunciação do filósofo Marx que afirma que no sistema capitalista as organizações sociais são patologias.
É provocado por esse quadro parafreudiano (porque se trata de psiquiátrico) que esse sintoma deve ser tema para um congresso de psiquiatria, posto que vários seguimentos do pensamento brasileiro já se manifestaram, e, entretanto, ele continua em sua molaridade-defensiva. Muitos juristas nacionais e internacionais compuseram textos e mais textos mostrando suas irracionalidades e nenhum signo foi removido do discurso-dominante. Já que o predomina é a força persecutória da desrazão dos mecanismos de defesa.
Enquanto os psiquiatras não realizam o congresso, aproveitemos enunciações do antipsiquiatra Ronald D. Laing, amigo do outro antipsiquiatra David Cooper, referentes aos mecanismos de defesa que estão disseminados como sintomas nesses estamentos. São mecanismos de defesa que o brasileiro encontra evidenciados em vários seguimentos sociais. Como também em muitas manifestações nazifascistas, golpistas, e congêneres.
Racionalização – Apresento a mim próprio uma história que me justifica.
Mistificação – Incorreta definição dos fatos.
Negação – O caso é este é alterado para o caso não é este.
Substituição – Vejo uma coisa em vez de outra.
Preecção – Transfiro meu interior para o exterior.
Idealização – Defendo uma ideia minha como se ela existisse no exterior.
Desrealização – Transformo a realidade por força de minhas fantasias.
Para o caso apresentado estes mecanismos de defesa dos personagens desses estamentos bastam, porém existem outros. Entretanto, esses mecanismos não atuam sozinhos, eles atuam entrelaçados com outros. Daí, a necessidade da produção política para impedir suas predominâncias como se fossem corpos reais da democracia.
A democracia é o corpo-político que serve como teste de realidade para se saber onde predominam os alucinados e delirantes.
Leitores Intempestivos